Vivemos tempos desafiantes para todos, por ínfimas razões.
Alguns
ficaram sem trabalho ou estão em lay-off, muitos ficaram a trabalhar a meio gás
e, com a crise emergente, adivinham-se dias difíceis. Não é preciso ser vidente
ou visionário.
Ninguém
vive do ar apenas, nesta Europa (quase) desenvolvida, onde os coronas tentam um
lugar ao sol, homens e mulheres têm contas para pagar, casa, água, luz, net,
talvez carro ou passes para os transportes públicos, seguros, roupas, artigos
vários, supérfluos ou não, alimentação, etc. urge sobreviver.
A
maioria dos que trabalhavam com público, fosse na área do espetáculo, educação,
animação ou outra, tiveram de adaptar as suas profissões ou ficaram a aguentar
a incerteza e a aguardar melhores dias, até que o inimigo invisível seja uma fraca
ameaça.
Quem
manteve o trabalho, adaptou-se a uma nova realidade, com novas regras, uso de
máscaras, distanciamento, saindo de casa apenas para aquisição de bens essenciais,
atividades laborais. Observou-se um enorme apagão em atividades lúdicas,
culturais e de lazer. Sem concertos, idas ao teatro, exposições, ateliers,
atividades desportivas, parques ou espaços de convívio ao ar livre…
Os
mais velhos tiveram de se manter à distância dos familiares e dos netos, envoltos
em
afetividades virtuais, beijos e abraços pelo whatsaap ou messenger e
muito cuidadinho para as pequenas criaturas que lhes descendem não os
contagiassem com uma espécie de zombi a ganhar terreno nos corpos humanos. Ao que
parece, os mais novos têm forte probabilidade de ser assintomáticos e
transmissores do potencial inimigo, sendo, consequentemente, um perigo para a
saúde pública.
As crianças
e jovens, confinados às suas casas, sem o convívio real com outras crianças e
jovens, sem poderem brincar, correr, saltar, abraçar, crescer e aprender
juntos, e com crescentes exigências virtuais, com aulas no computador e/ou na
TV, imensos trabalhos, links, propostas de visualizações de vídeos, sites para
pesquisa e emails para responder. Estes, os homens e mulheres de amanhã. O que se pode
espera que venham a ser, meninos e meninas que não socializam uns com os outros,
nem brincam na rua?
Imagino
que quando se voltar a frequentar o espaço escolar, as medidas de cuidado sejam
tantas que se algum jovem for apanhado a tirar a máscara atrás do pavilhão,
numa tentativa de saber a que sabe um beijo, possa sujeitar-se a um processo
disciplinar ou a uma suspensão. Imagino apenas, e espero estar redondamente
enganada. Peço-vos que me ajudem a imaginarmos, juntos, melhor.
Alerta,
algo tem de mudar. A quarentena ensinou-nos, entre muitas outras coisas, que o
mundo precisa de menos poluição, menos
CO2 na atmosfera, menos filas de trânsito, menos multidões em correria
frenética para cá e para lá e, pelo contrário, mais caminhadas ao ar livre e a
desaceleração de uma realidade que se impôs insustentável.
Não,
não queremos voltar ao que tínhamos, não, não queremos condenar as gerações
depois de nós ao eterno uso de máscara e à destruição dos espaços naturais da
nossa casa maior, o planeta terra. Se nada fizermos depois do covid-19, virão
outros vírus. E não sou eu que o digo, mas a maioria dos cientistas. Basta
pesquisarem um pouco a informação disponível.
Não
precisamos do medo, no sentido de ficarmos paralisados ou não pensantes e
cegamente obedientes, precisamos sim de ter a coragem de mudar as nossas ações,
individualmente e em grupo, porque não chega continuar no conformismo deixando
que outros decidam por nós, pelas nossas vidas e pelo futuro dos nossos filhos
e netos. Precisamos de respeitar o nosso vizinho, colega, familiar e manter as
distâncias, para que não nos invadamos uns aos outros e respeitemos o espaço de
cada um.
De
facto, não precisamos de muitas coisas, como vários pares de sapatos, armários
cheios de roupa e outros bens materiais, muitas vezes desnecessários e dos
quais abdicámos no tempo de confinamento.
Queremos
mais tempo para nós e para os
familiares, de fortalecer o comércio local, reforçar a possibilidade de
teletrabalho em muitos setores da nossa atividade profissional, onde se
demonstrou essa viabilidade, precisamos de um mundo que não nos leve à extinção
nas próximas décadas, da qual, queridos humanos, já estivemos mais longe.
Há
medidas políticas que terão de mudar. É necessário abrandar o aquecimento
global do planeta, pôr um travão à extinção de espécies e decréscimo da
biodiversidade, fazer menos lixo e reduzir, reutilizar, reciclar, além de
outros rs.
Estejamos
atentos ao que se passa noutros
continentes, porque inevitavelmente vai afetar-nos e, enquanto aceitarmos as
enormes discrepâncias sociais por esse mundo fora, vamos continuar muito longe
de ser a geração da mudança positiva. Bem, geração da mudança já somos, resta
definir que mudança queremos ver no mundo.
A
humanidade precisa de menos coisas, mais afetos, mais empatia, mais arte, mais
cultura.
Como
poderíamos viver sem música? Ou sem literatura? Sem pintura?
A
arte é essencial para sermos melhores pessoas. O conhecimento e a empatia de
mãos dadas podem criar possibilidades de transformação infindáveis.
Estamos
no início dos anos 20, em pleno século XXI, cada um de nós deve assumir o
potencial adormecido em si, o génio entorpecido, não de forma egoísta e
narcisista, mas de forma altruísta e verdadeiramente empática e superar-nos, individualmente
e socialmente.